JOHN NICHOLSON EM ALQUIMIA DAS CORES

Na antiga Grécia era muito conhecido o antagonismo entre Dionísio e Apolo, pois ambos representavam forças inegavelmente atuantes na psique e consequentemente no cotidiano de cada um dos indivíduos.

A modernidade deu novas cores de entendimento sobre essa questão que atualmente pode ser compreendida da seguinte forma: Apolínia seria toda forma de observação íntima da beleza e Dionisíaca seria toda a busca pelas sensações e satisfações inebriantes sejam de que tipo for.

Essa polaridade então ganhou novos contornos, porém toda polaridade é “per sí” oposta e complementar assim como é com a força tectônica e os raios cósmicos, com as emanações telúricas e a inspiração religiosa, luz e trevas e toda a miríade de projeções de influxo dessas forças o que deixa claro que essas forças estão em um eterno movimento de criação e destruição mutuas e continuas possibilitando dessa forma a manifestação primordial da criatividade em todas as esferas da existência.

São raros os artistas que conseguem absolver e explicitar em suas obras esse movimento e ainda mais raros são os que conseguem retratá-lo tão fielmente a ponto de capturar o olhar do observador com a força de um tornado e levá-lo em uma viagem em que na volta este se encontre outro, totalmente diferente daquele que embarcou nessa mesma viagem.

Como numa transformação hermética a obra de John Nicholson leva o observador por estágios de entendimentos paulatinos e sucessivos que, semelhantes ao processo alquímico conduz por final a compreensão da totalidade de sua obra, a pedra filosofal pessoal do artista.

Nesse processo é fundamental percorrer adequadamente todos os quatro estágios de elaboração que são os de , “Solutio, Coagulatio, Calcinatio e Sublimatio”, que ao final conferem ao observador a transmutação do chumbo monocromático de sua percepção anterior no ouro da percepção multifacetada posterior a visualização da obra, sendo essa realização, como citado anteriormente, a compreensão ultima da verve criativa do artista.

Pegando esse viés metafórico podemos nos aventurar no caminho da apreciação dos trabalhos desse americano do Texas que há 40 anos adotou o Brasil como sua segunda nacionalidade.

Na Alquimia “Solutio” é a operação ligada ao elemento água o que nas telas de Nicholson pode muito bem ser identificado com a presença constante de linhas sinuosas, curvas e formas onduladas que estão sempre dando a impressão de movimento.

A etapa seguinte é o “Coagulatio” que representa a materialização terrena e suporte do olhar através das formas angulares ou retilíneas e que aos poucos estruturam a percepção óptica conduzindo-a sutilmente ao primeiro limiar da compreensão.

Em seguida temos a etapa do “Calcinatio” que representa o fogo primordial, o Elã e o sentimento de exaltação, inspiração profunda e expansão da consciência que na obra de Nicholson parece encontrar nas cores primárias e na escolha de pigmentos bem definidos sua expressão mais forte.

E por fim temos a etapa do “Sublimatio” que relacionado com elemento Ar é primorosamente representado pelos tons de Azul Claro, Rosa e Branco em muitas de suas telas conferindo as mesmas uma leveza impar, tal qual a de um perfume sutil que parece acompanhar o observador por varias horas mesmo após o término do período de apreciação de suas obra.

O vigor e a pungência da arte de John Nicholson é indiscutível, suas habilidades criativas e seu total domínio sobre seu estilo também são marcantes ,e por isso não seria nenhum exagero dizer que sua destreza na demarcação dos limites entre luzes e sombras dos seus trabalhos figurativos e na escolha das cores são simplesmente geniais!

É importante também notar a influencia que sua arte teve sobre o trabalho de vários artistas atuais de grande visibilidade e claros exemplos são encontrados em Beatriz Milhases e Cristina Canali.

John Nicholson tem também a seu favor uma enorme capacidade de elaboração intelectual que lhe confere uma inteligência criativa singular, capacidade que é exercida preferencialmente na investigação do discurso dialético entre o figurativo lírico e o abstrato.

No tocante ao seu trabalho figurativo o que mais impressiona é a sua capacidade de extrair um teor de expressividade imenso utilizando-se apenas de recursos básicos e por isso é quase impossível não compará-lo a Henri Cartiér Bresson que com apenas uma Hasselblad fazia obras primas de incomparável beleza.

Não obstante sua obra não ter sempre conotações diretas com sua visão das atualidades nas áreas cientificas, sociais e politicas , Nicholson é também muito conhecido por ser grande referencia também nessas searas e é sempre procurado quando alguém,dentre conhecidos e amigos,quer atualizar seus conhecimentos por esses domínios.

A eloquência com a qual transita entre o mundo acadêmico das ciências exatas, o da filosofia, e o das artes, é notável , principalmente quando se leva em conta que o faz sempre com conhecimento profundo dos assuntos abordados o que certamente o eleva ao patamar dos artistas completos.

Oriundo do minimalismo americano dos anos 70 John Nicholson passou ainda nessa mesma década a trabalhar o figurativo lírico passando logo em seguida a se dedicar ao abstrato onde até a atualidade faz suas principais incursões artísticas e aonde vem desenvolvendo um trabalho altamente significativo e que vem chamando a atenção do setor mais intelectualizado das artes plásticas e mesmo das artes em geral.

Uma das características mais interessantes da formação de Nicholson é que quando ainda muito jovem passou uma temporada na Inglaterra trabalhando com matemática aplicada ao estudo da meteorologia avançada o que é algo que requer um esforço de ambos os hemisférios cerebrais ao mesmo tempo já que á racionalidade exigida pelos cálculos algorítmicos juntou-se a sensibilidade intuitiva de percepção das mudanças no clima e isso parece ter gerado uma terceira faculdade perceptiva que o artista aplicou no oficio da pintura.

Nesses tempos sombrios que o Brasil atravessa a arte de John Nicholson com toda a sua vitalidade, luminosidade e arrebatamento parece apontar também para um aspecto numinoso, não racional como toda numinosidade, porém também extremamente auto-definidor e até mesmo redentor no sentido de nos proporcionar uma reconexão com nossas realidades mais profundas , com a nossa identidade anímica, e por isso para ilustrar um processo semelhante cito Albert Camus que dizia que seu gosto pelas viagens dava-se pelo o que lhe era proporcionado pelo olhar do povo de cada nova cidade que visitava, olhar esse que lhe conferia sempre um elemento novo de entendimento de sua propia personalidade .

A verdadeira função da arte,da grande arte,é a de ser sempre libertadora de tudo o que oprime a plenitude do espirito e esse parece ser o elemento fundamental, a pedra de toque da arte de John Nicholson.

Zenon Valcacer
Zam Zam Art&Mídia